A recente imposição de tarifas sobre produtos importados da China pelo governo dos Estados Unidos pode representar uma oportunidade estratégica para a indústria brasileira, especialmente para o polo eletroeletrônico da Zona Franca de Manaus. A avaliação é de Jorge Junior, presidente executivo da Eletros (Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos), uma das maiores entidades empresariais da América Latina.
Segundo o dirigente, atualmente é praticamente inexistente a exportação de eletroeletrônicos da Zona Franca para o mercado norte-americano. “No passado, exportamos condicionadores de ar e televisores. Hoje, isso não acontece mais. Mas com as novas tarifas impostas aos produtos chineses, a Zona Franca pode voltar a ser uma alternativa viável e atrativa”, afirmou.
Entre os produtos com potencial de retomada nas exportações estão aparelhos de ar-condicionado, televisores, micro-ondas, computadores, celulares, tablets e componentes eletrônicos. Para Jorge Junior, o momento é promissor, especialmente se a guerra comercial entre EUA e China se prolongar. “Se for uma medida de longo prazo, há grande chance de novos investimentos virem para Manaus, ou de empresas já instaladas ampliarem sua atuação visando o mercado americano”, destacou.
Apesar das possibilidades, o cenário não é isento de desafios. O principal deles é a infraestrutura logística da região. “Precisamos encarar de frente gargalos históricos. A BR-319 precisa deixar de ser pauta e virar solução. É hora de asfaltar e considerar até uma ferrovia margeando a rodovia, além de transformar os rios em hidrovias eficientes e ampliar o Aeroporto Internacional Eduardo Gomes com uma segunda pista”, disse.
Outro fator que preocupa a indústria é o câmbio. A alta do dólar que chegou a R$6,00 tem pressionado os custos de produção, principalmente porque muitos insumos não são fabricados no Brasil e são comprados em moeda estrangeira. “Isso encarece a produção e afeta diretamente a competitividade da indústria nacional”, alertou o executivo.
Jorge Junior também analisou o pano de fundo da medida norte-americana. Para ele, a imposição de tarifas não é apenas protecionismo, mas parte de um movimento de reindustrialização dos Estados Unidos. “Eles querem voltar a produzir dentro de casa, como já fizeram no passado. E, ao se tornarem mais fortes internamente, é provável que comecem também a exportar mais. Isso exigirá do Brasil uma postura ativa em defesa comercial para evitar concorrência desleal”, observou.
A relação comercial entre Brasil e Estados Unidos é, segundo ele, marcada por certa reciprocidade. Ambas as nações praticam atualmente uma alíquota de 10% sobre importações mútuas. “O governo brasileiro tem demonstrado interesse em revisar essas taxas para melhorar as condições de negociação. Somos grandes compradores dos Estados Unidos e temos potencial para vender mais também”, explicou.
O presidente da Eletros ressaltou que a Zona Franca de Manaus já está sendo procurada por empresas nacionais e estrangeiras interessadas em produzir para exportação. “Temos infraestrutura industrial, mão de obra qualificada, energia barata e experiência consolidada. A Zona Franca pode se tornar um porto seguro neste novo cenário geopolítico e comercial. Mas é preciso agir com urgência para eliminar os obstáculos logísticos que ainda nos limitam”, concluiu.
Diante de um cenário global instável e de reposicionamento de cadeias produtivas, a entrevista do Jorge Junior reforça a importância estratégica da Zona Franca de Manaus como alternativa viável e competitiva no cenário internacional. Para que essa oportunidade se concretize, será preciso agir com rapidez, garantindo infraestrutura logística adequada e um ambiente regulatório que favoreça a atração de novos investimentos.
Com potencial industrial consolidado, mão de obra qualificada e vocação exportadora, a Zona Franca está mais uma vez diante de um momento decisivo e, como destaca o presidente da Eletros, “é hora de transformar discurso em ação”.
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